Lei 13.465/2017 inova e possibilita criação de condomínio de lotes
No Brasil tem sido muito
comum o desenvolvimento dos denominados “condomínio de lotes” ou
“loteamento fechado”. Apesar da existência de centenas de
empreendimentos nestas modalidades, não havia, até então, regramento
claro e específico no âmbito federal quanto a estes temas, que, apesar
de parecidos, juridicamente possuem diferenças significativas.
Isto porque, o loteamento (Lei 6.766/79)
trata-se de uma modalidade de parcelamento do solo, em que uma gleba é
subdividida em diversos lotes, totalmente separados juridicamente uns
dos outros, com a criação de vias e espaços públicos que são
transferidos à titularidade do município.
Já no condomínio (Lei 4.591 e Código
Civil/2002), não há qualquer parcelamento do terreno, permanecendo
íntegra a gleba originária, mas, por convenção, há instituição de um
condomínio pro-diviso, dispondo que naquele imóvel haverá partes que
serão de propriedade comum e outras de titularidade exclusiva de cada um
dos condôminos, havendo o fracionamento do solo em partes ideais de
propriedade e vinculadas, por ficção jurídica, a cada uma das partes
exclusivas (unidades autônomas).
Ocorre, porém, que tanto a Lei 4.591/64
(artigo 1º), quando o Código Civil (artigo 1.331), estabelece que para
ser possível a instituição de condomínio edilício é necessária a
existência de edificações, o que, inicialmente, não se observa no caso
da venda de lotes.
Pois bem, com o objetivo de superar tais
entraves legislativos e de tentar conferir alguma segurança jurídica
aos condomínios de lotes e loteamentos fechados, alguns municípios
editaram leis estabelecendo a possibilidade de sua implementação.
Quanto ao “loteamento fechado”, o poder
público municipal na maioria das vezes, concede o uso exclusivo das
áreas públicas daquele empreendimento aos proprietários dos lotes,
normalmente conferindo à associação formada pelos moradores a
competência para gerir a “coisa comum” que, neste caso, é de propriedade
pública, mas com uso cedido ao particular.
Apesar disso, não raras vezes vê-se
ações questionando a destinação a particulares de bens que,
inicialmente, seriam de uso comum do povo (ruas, praças, equipamentos
públicos) e, ainda, a legitimidade do município para criar uma nova
modalidade de loteamento, apesar de a competência para legislar sobre
direito urbanístico ser concorrente apenas da União, Estado e Distrito
Federal, cabendo ao município apenas a suplementação do que já existe e
tratar assuntos de interesse local (artigos 24, I e 30, I e II, da
CF/88).
Igualmente, observa-se a legislação de
alguns municípios estabelecendo a possibilidade da criação do condomínio
de lotes, através de normas que muitas vezes confundem os institutos do
loteamento e do condomínio.
Neste caso, parece ser ainda mais
questionável a competência do município para legislar sobre o tema, que
indiscutivelmente trata-se de matéria afeta ao direito civil, em relação
a que Constituição estabelece ser privativa da União (artigo 22. I).
Defendendo a possibilidade da criação do
condomínio de lotes, alguns juristas argumentam que tais leis advêm do
que já estabelece o Decreto-Lei 271/67, o qual equipara o condomínio ao
loteamento. Ocorre, no entanto, que tal dispositivo deveria ser
regulamentado dentro de 180 dias da sua publicação, o que, até então,
nunca ocorreu.
Há, ainda, uma tentativa de equiparação
ao condomínio horizontal de casas, previsto no artigo 8º da Lei
4.591/64. Neste ponto, a 4ª Turma do STJ, no julgamento do REsp
709.403/SP, deixou claro que para ser possível a instituição do
condomínio horizontal é necessário que haja edificação pronta ou, ao
menos, a aprovação de um projeto de construção.
Desta forma, com o objetivo de positivar
na legislação federal a possibilidade da criação do “condomínio de
lotes”, foi publicada, no último 11 de julho, a Lei 13.465, que incluiu o
artigo 1.358-A no Código Civil.
Com isso, inaugura-se um novo conceito
de lote, que, inicialmente, era somente formado a partir do
desmembramento ou loteamento, e, agora, passa a ser também a correta
denominação para unidade autônoma compreendida em condomínio de lotes,
sem parcelamento do solo.
Apesar da imediata entrada em vigor da
norma, o tema ainda carece amadurecimento, sobretudo diante da
necessidade de adaptação das leis de uso e ocupação do solo dos
municípios para contemplar este instituto, em especial quanto a
regulação dos parâmetros urbanísticos aplicados ao empreendimento e às
unidades autônomas, as quais ainda não têm área construída
pré-determinada.
Além disso, com o condomínio de lotes ter-se-á o loteamento latu sensu
de uma gleba, mas sem, inicialmente, a urbanização da cidade (vias,
parques e espaços públicos). Por este motivo, é possível que a
legislação municipal venha a exigir algum tipo de contrapartida do
empreendedor, tema que merece artigo próprio, tendo em vista sua
complexidade e diversidade de pontos de vistas a serem analisados.
Com efeito, a recém promulgada
positivou, ainda, o chamado “loteamento de acesso controlado” que não
trata propriamente do “loteamento fechado”, mas permite ao poder público
municipal a regulamentação do controle de acesso, sem que haja, no
entanto, “o impedimento de acesso a pedestres ou a condutores de
veículos, não residentes, devidamente identificados ou cadastrados”.
Não deixou claro o legislador se tal
controle de acesso pode vir a ser feito em relação aos loteamentos já
existentes ou, ainda, os requisitos para criação do referido controle, o
que dá uma maior liberdade ao Poder Público municipal quanto a
implementação desta nova modalidade.
É fato que a referida normal trouxe
muitas e importantes inovações para o direito imobiliário, não apenas em
relação aos temas aqui tratados, garantindo, sem dúvidas, uma maior
segurança jurídica ao empreendedor, apesar da necessidade de
amadurecimento da matéria, em especial quanto aos aspectos urbanísticos
envolvidos.
Emília Belo é sócia do Queiroz Cavalcanti Advocacia.
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